sábado, 10 de janeiro de 2009

LOUIS SOUTTER


LOUIS SOUTTER
LOUIS SOUTTER ( nasceu na Suiça em1871,) originário de uma família da alta classe média suíça, era primo de Charles Edouard Jeanneret - Le Corbusier, estudou desenho, arquitetura e música (violino), sem se graduar. Viajou para os EUA em1897 e se estabeleceu em Colorado Springs onde dirigiu o departamento de arte da faculdade de Colorado e contraiu matrimonio com Madge Fursman. Depois de seu divórcio retornou para a Suíça levando a partir de então, uma vida errante. Foi internado em um hospital psiquiátrico aos 52 anos de idade, onde passou o resto de sua vida ( morreu aos 71 anos em 1942). As primeiras obras de Louis Soutter foram influenciadas pela pintura mural romana, uma vez no hospital psiquiátrico, sua arte passou por uma mudança radical. Com dificuldades de visão começou a pintar usando os de dedo e, ás vezes, o corpo todo. Essa segunda fase do seu trabalho sofreu incompreensão e rejeição, após sua morte, porém, seu trabalho ganhou o reconhecimento junto aos críticos de arte que passaram a considerá-lo um dos pioneiros da chamada “Arte Bruta”, termo proposto por Jean Dubuffet na década de 1940 para a arte feita por indivíduos sem formação artística, ignorantes (consciente ou inconscientemente), em geral crianças, reclusos, doentes mentais, esquizofrênicos, gente onde não há qualquer preocupação em realizar uma obra de arte segundo um padrão conhecido. A comunicação artística na arte bruta faz-se em moldes tradicionais, espontâneos, sem referências estéticas, de forma livre de preconceitos. Não significa que se apresente como crítica da própria arte, não se trata de uma forma de expressão que desafie cânones, pois caracteriza-se pela indiferença total à arte e ao artístico.












 

Louis Soutter, o trágico e “louco” artista suíço, ainda em vida, foi considerado um grande artista por pessoas como Hermann Hesse (abaixo), que escreveu um poema em sua homenagem e nos anos 90 foi realizada uma exposição, de seus trabalhos em Parism que foi dividida em períodos de acordo com títulos de suas obras como "E se o sol retornar para mim novamente", "Os incrédulos” etc. Em uma carta a seu primo e colaborador Le Corbusier, ele escreveu: "Os ‘incrédulos’ são seres sofredores, uma casta purificada e elevada pela dor torturante do isolamento. [...] Nosso envolvimento com a chamada realidade realmente nos separa da realidade. Nossas preocupações, objetivos, alegrias e tristezas, realmente nos separaram da realidade suprema que é a marcha irreversível para o esquecimento. O confinamento é um dos piores castigos, porque nos expõe ao nada, mas esperando. A inteligência se torna nossa inimiga quando nos expõe à verdade e não nos mostra como escapar dela. Portanto, a arma mais estúpida, a coragem, é a nossa arma única e final. A coragem é o que nos faz tomar conta das nossas preocupações diárias, como se elas realmente importassem. A coragem é um braço para o assim chamado derrotado como a alegria é um braço para o chamado vitorioso. O budismo, que nos diz que tudo é ilusão, ainda não explica para quê esse conhecimento é útil*. Vista-se em sua coragem como em uma camisa suja, porque não há uma limpa possível. A coragem é uma virtude e a fé justifica a existência de virtudes.” * pode ser um aviso: cuidado para que seus sonhos não se tornem obsessões que se transformam em uma prisão.”






















 

LOUIS SUTTER

HERMANN HESS

A pintar quadros lindos e perfeitos,
a tocar no violino sonatas sem defeito
e lindas - a Kreutzer, à Primavera –
aprendi, já faz tempo, quando jovem
corria para o mundo aberto e claro:
eu era moço, era louvado e era amado...
Mas certa vez me olhou pela janela,
a rir com a maxila descarnada,
a Morte – e o coração
gelou dentro de mim, gelou em mim
e me gela ainda hoje. Eu escapei,
vaguei de um lado para outro,
mas me pegaram e me puseram fechado
ano após ano. Da minha janela,
por entre as grades, ela me arregala os olhos
e arregalada ri. Me conhece. Ela sabe.
Em papel grosso às vezes pinto homens,
pinto mulheres, pinto Jesus Cristo,
Adão e Eva, o Gólgota,
não perfeitos, não lindos, mas sentidos.
Com tinta e sangue eu pinto, com verdade,
e a verdade é terrível.
Recubro a folha, risca sobre risca,
mais alta, mais grudada, cinza, prata, preta,
e as pontas dos hieróglifos
deixo encresparem-se espalhados feito musgo,
crepitarem como granizo seco, afilarem-se em espinha de peixe,
cinzentos véus, redes de linha fina, teias de aranha,
vento na relva, trança de raízes, caligrafia,
rabisco dez mil linhas em blocos e mais blocos,
lisas inchadas arrepiadas,
em plumas flamejantes, empinadas, esquivas,
poupo aos rabiscos os corpos da neve,
jogo Jesus ao chão
sob o fardo da cruz, voejam pássaros
como espectros num matagal de sonho, flores em flocos
a rir aflitas entre ervas murchas.
Eu às vezes esqueço,
eu às vezes conjuro tanta angústia,
eu às vezes escuto de distantes
anos de sombras, muitos anos, música:
Sonata a Krautzer*... Mas na janela
sei que, nas minhas costas,
riem de mim.
Mas quem me conhece, quem sabe – é Ela.


_________
*Sonata No.9, para violino: “à Kreutzer”, Beethoven










RITUAIS QUE OS CREPÚSCULOS IGNORAM

, teu corpo, muito próximo, transpira
entre a parede e o abandono,
durante esse intervalo de tempo
conhecido como noite.

Agora, um raio de sol cinza
revela e ilumina pequena
nuvem de poeira em círculos e tremores.
Eu, embriagado pelo licor extravagante
da luxúria (cassis?), danço no mais extremo da noite
(que é quando o sol põe
aquela legenda laranja no céu),
a dança selvagem das circunstâncias.

Um Serafim, coberto de plumas e paetês
(provavelmente)
foi quem arquitetou este jogo
sob este sol frio de outono
que para você não é nunca
antigo nem cinza na cor.

Você sabe que gosto de você.
Você sabe que não sente minha dor
e de como gosto de você,
te disse isto num sonho.

Mas de toda dor, você não sabe,
você não ouviu toda minha dor.
Não tens tua face sobre a minha dor.
Uma velha canção dos Beatles
(“And anytime you feel the pain,…”)
foi o que você ouviu,
e é só o que tenho para ti agora:
os rituais que os crepúsculos ignoram.



.
.
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Minhas sincera homenagem!

"Si Khalil ouve esta voz que se ergue na noite. É a voz de um povo que desperta e que cedo vai estrangulá-lo. Cada minuto que passa o separa da sua antiga vida. O futuro está cheio de gritos. O futuro está cheio de revoltas. Como represar este rio transbordante que vai submergir as cidades? Si Khalil imagina a casa desabada sob o pó dos escombros. Vê os livros aparecer por entre os mortos. Pois nem todos serão mortos. É preciso contar com eles, quando se erguerem com os seus rostos sangrentos e os seus olhos de vingança." in "A Casa da Morte Certa"


"Quando Samantar saiu da gruta, o sol levantava-se por cima do mar, fazendo explodir debaixo dos seus raios mágicos todas as cores da paisagem. O verde dos palmeirais, o ocre das extensões arenosas, o azul do mar, apareciam em todo o esplendor da sua frescura primitiva. Era quase um chamamento sensual, uma exortação ao amor que Samantar sentiu com uma indizível felicidade. Então, fez vaguear o olhar maravilhado por toda aquela beleza cintilante debaixo do sol, como uma oferenda àquele que simplesmente quer viver e que a ambição de um homem quase destruíra." in "Uma Ambição no Deserto"





PEQUENA CANÇÃO (sem termo)  
A    UM   CHAMADO   “ERNESTO”

Floresceram canções brancas que semeaste com alvaiade
em nossas almas e foste embora, era outubro e outubro é sempre
É o outubro em que eu vivo, dias de tudo e de vaidade
E tu, então, um sorriso na alma e um sonho de flor carente.

É outubro e as cores se renovam, mas há um azul a inventar,
o azul de um grito que nada diz da luta em toda cantiga
nem da flor carente, nem das canções brancas a germinar
apenas diz das pétalas do desejo que tortura e castiga.

Destas pétalas do desejo, de uma só cor - uma cor só delas -
nasce o precipício (que procuras sob o sol ao qual pertences)
e nasce o mundo nu, pleno de justiça e igualdade, que exalas.

Oxalá, o aguaceiros de desejos, sonhos e fortuna que alcances,
- a renovar aspirações de fraternidade que nos corações instalas -
vertam do silencioso mar da morte traiçoeira que afinal vences!
.
.



ORAÇÃO DAS DIVERGÊNCIAS

,se o Profeta Gentileza
seria um bom presidente,
Nunca se saberá...
Mas, seria um bom presidente
o Profeta Gentileza?

Um grande ballet deu “El sombrero de tres picos”
(de Falla)
Mas ao fim, o som, que também traz
a oração das divergências,
se rende ao silêncio,
que flutua na energia destrutiva das escadarias,
como o pó à luz do sol.

O sabão em pó azul também pensa estar colorindo
a capa de chuva de plástico azul
(enquanto cuida de lavá-la),
pensa possuir esse poder de mudança.

Colorir oportunidades, oportunidades de colorir...
E você dando nomes aos bois e as cores, cores e bois,
mas cada um de nós
(tu e eu, em nosso íntimo)
tem todas essas pessoas de cera
para proteger do calor!
Pessoas que
(como nós, eu e tu)
se deterioram se não o fizermos.







A PALAVRA “FODA-SE

, durante o dia, foi quando o muro desabou
(foi derrubado na verdade, vimos na televisão),
das janelas dos edifícios do mundo um grito.
A liberdade de óculos,
porque míope
( a esperança também, segundo Rodrix),
havia chegado durante aquelas
horas mornas da tarde
(julgamos).

Mas, assim que o muro foi derrubado,
surge a nau dos insensatos
à tosquiar a lã vaga das promessas
daquela velhota de óculos.
Uns tipos surdos e mesquinhos,
Metidos em fardas de papel crépon
(verde oliva)
girando no ar em seus vôos cegos
(insetos em inútil busca de luz),
vôos que fizeram nosso pesadelo naquela noite
e em todas as outras anteriores
por mais de vinte anos.

Por mais de vinte anos,
também, tive minha caneta arrancada das mãos
por alguém que em seguida rabiscou
com ela a palavra “foda-se
atrás da porta do banheiro público
(onde me encontrava escondido, fumando talvez).




DA EXISTÊNCIA DAS CORES

As cestas do açafrão e seu ocre,
(o ocre das reminiscências);
os eventos religiosos
(minerais e metálicos);
a eletricidade estática das orações;
o carnaval.

O piano nas saletas
penetrando as crianças nuas, nuas
em forma de som;
a dança.

O fio do desejo queimando os pés
dos meninos acrobatas,
ágeis e ilógicos;
aquelas vozes em uníssono
(esculturas de luz, eloqüentes)
e ondas e fulgurações
tingindo de preto o uniforme do jóquei,
e ao branco oferecendo a fatalidade,


não podem ser apenas
porque somos sábios.



Um comentário:

Nadia de Souza disse...

Lindos seus poemas, tocantes e sensíveis. Parabéns pela premiação do soneto. Prêmio muito bem merecido. Bjss